Indústria 4.0 avança no Brasil, mas gargalos tecnológicos e qualificação ainda limitam expansão

Empresas buscam integrar automação, inteligência artificial e internet das coisas às cadeias produtivas, enquanto especialistas alertam para desigualdades regionais e falta de mão de obra capacitada

A chamada Indústria 4.0, que incorpora tecnologias como internet das coisas (IoT), inteligência artificial (IA), robótica avançada e sistemas ciberfísicos à manufatura, ainda caminha a passos desiguais no Brasil. Segundo a Confederação Nacional da Indústria (CNI), apenas 28% das empresas industriais de médio e grande porte adotaram tecnologias relacionadas à transformação digital em seus processos até 2023.

“O Brasil tem um grande potencial em automação industrial, mas enfrenta desafios históricos como a defasagem da infraestrutura tecnológica e a escassez de profissionais com qualificação técnica específica para sistemas integrados e operações críticas”, explica Fábio Camargo Miki, engenheiro eletricista com pós-graduação em automação industrial pela PUC-PR e experiência internacional nos setores de óleo e gás, mineração e papel e celulose.

Com atuação em países como México, Brasil e Moçambique, Miki destaca que as iniciativas mais bem-sucedidas de digitalização industrial envolvem sistemas de controle distribuído (DCS) e uso intensivo de sensores e dados em tempo real. “Trabalhos com sistemas ABB, Siemens, Yokogawa e Emerson mostram que é possível atingir padrões globais, mas isso exige planejamento de longo prazo e investimento em manutenção e atualização de sistemas críticos”, afirma.

Levantamento realizado pela Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) estima que o uso pleno de tecnologias da Indústria 4.0 pode gerar uma economia anual de até R$ 73 bilhões com ganho de eficiência nas fábricas. No entanto, 90% das indústrias brasileiras ainda operam com baixo ou nenhum nível de automação inteligente, de acordo com o Mapa da Digitalização da Indústria.

Na avaliação de Miki, que liderou projetos de integração mina-planta-porto, o gargalo não está apenas na aquisição de tecnologia. “É uma questão estrutural. Muitas plantas operam com sistemas antigos, sem conectividade, e a migração para arquiteturas digitais exige compatibilização de equipamentos legados e capacitação técnica local. Isso encarece e desacelera o processo.”

A assimetria regional também preocupa. Enquanto estados como São Paulo, Paraná e Minas Gerais avançam com iniciativas de inovação industrial, regiões Norte e Nordeste ainda enfrentam limitações severas em infraestrutura energética, conectividade e formação profissional. Segundo o IBGE, em 2023, apenas 8% das empresas industriais do Norte do país utilizavam algum sistema de automação conectado à internet.

Entre os setores mais avançados no uso de tecnologias da Indústria 4.0 no Brasil estão papel e celulose, petróleo e gás e metalurgia, segmentos nos quais Miki desenvolveu soluções integradas de controle de processos. “Essas indústrias operam com margens apertadas e alto risco operacional. Por isso, são pressionadas a investir em confiabilidade e predição de falhas por meio de automação avançada.”

A perspectiva para os próximos anos é de expansão lenta, mas consistente. A Pesquisa de Inovação da Indústria 2024, da CNI, indica que 41% das empresas pretendem investir em digitalização até 2026, com foco em eficiência energética, redução de perdas e integração de sistemas de chão de fábrica com plataformas de gestão (ERP e MES).

Para Miki, o futuro da indústria brasileira depende da capacidade de formar um ecossistema de inovação com base técnica sólida, políticas de incentivo coordenadas e atração de talentos. “A Indústria 4.0 não é apenas sobre sensores e algoritmos. É sobre transformar o modo como fabricamos, gerenciamos e tomamos decisões, com impacto direto na produtividade e na competitividade internacional do país”, conclui.

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